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sábado, 30 de janeiro de 2016

Somos inimigos por discordarmos em nossas crenças?




[*Correção da tradução: “Apenas um estranho no ônibus, tentando fazer seu caminho de casa” → “...tentando voltar para casa”.]


Sempre serei grato por duas pequenas [grandes] coisas que me foram ensinadas desde cedo: 1) que podemos pensar/acreditar de forma diferente de outras pessoas – essa é uma liberdade concedida por Deus e pela Declaração Universal dos Direitos Humanos; 2) que ninguém é meu inimigo simplesmente por discordar de minhas posições/crenças, e vice-versa.

Sendo quem sou, é difícil não olhar para o mundo ao meu redor sem me lembrar dos chamados “conflitos religiosos” que têm marcado a história humana. As aspas (“ ”), a propósito, indicam minha discordância com a adjetivação daqueles tipos de conflito que tão prontamente indicam como “religiosos”: isso porque chamá-los de “religiosos” implica num reconhecimento, mesmo que involuntário, ou de que a “religião” (que muitos interpretam como sendo uma “religação” ou “retorno” ao Divino) seja um fenômeno fundamentalmente violento, ou de que a violência possa ser legitimamente designada como “religiosa” (ou seja, que possamos nos relacionar com o Divino por meio da violência) – eu, obviamente, rejeito as duas premissas.

Observando o que tem ocorrido ao meu redor, não posso deixar de perceber o quão difícil é ver aqueles dois princípios que me foram ensinados sendo aplicados no mundo, e o quão difícil é manter a lealdade a eles. Isso porque hoje, mais do que em qualquer outra época em minha relativamente curta vida, pensar/crer diferentemente de outros parece ser encarado como uma ameaça beligerante – seja em termos de fé religiosa, em termos de política ou de qualquer outra coisa.

Pessoalmente, aprecio muito a diversidade do [e no] mundo. Prefiro uma realidade multicolor à bicoloridade que alguns impõem ao mundo. Tudo é muito mais “belo” por haver cores, formas, sons, aromas, crenças diferentes. A vida espiritual é muito mais rica por haver milhares de formas diferentes de compreender a relação entre o “objetivo” e o “misterioso”, entre a “Criação” e o “Criador”. Mesmo o Cristianismo é muito mais belo, e muito mais vivo, justamente por haver centenas de formas distintas de compreendê-lo e de praticá-lo.

Quando olho para essa diversidade e me reconheço como um dos elementos para as diferenças de tonalidade, não posso ver outras pessoas como minhas inimigas – por mais que discorde de suas crenças e, intelectualmente, as critique. Como eu, no que tange à experiência “religiosa”, elas são viajantes numa trilha de descoberta do Divino. Elas mesmas podem não interpretar suas e minhas experiências dessa forma, mas, ao menos em nossa experiência de busca, compartilhamos semelhanças.

Pessoalmente, acredito em revelação divina. Acredito que aquela Realidade que chamo de Deus se revela ao ser humano de inúmeras formas. A maioria dos cristãos, talvez, diria que Deus se revela por meio das Escrituras (a Bíblia). Eu também acredito nisso. Mas, para mim, Deus se revela também por meio de nossas relações com as outras pessoas; por meio da comunidade de fé; por meio da natureza; por meio da oração; por meio do trabalho; por meio da arte e do entretenimento; por meio da ciência e do conhecimento intelectual; enfim, por meio da história humana.


Deus está sempre falando. Nós, talvez, é que não ouvimos. Deus fala, algumas vezes, inclusive por meio das vozes daqueles de quem discordamos. Por isso, não posso vê-los como meus inimigos.

+Gibson