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domingo, 14 de setembro de 2014

A hibernação da inteligência dos militantes da “religião civil”


A coisa mais triste a respeito do período eleitoral – e, em minha experiência, isso vale tanto para o Brasil quanto para os EUA – é que a inteligência de militantes partidários parece entrar em hibernação. Frequentemente, parece haver uma explicitação de incoerências entre o que geralmente afirmam, em outros momentos, e aquilo ou aqueles que tão vorazmente defendem em sua tola militância partidária.

Bem, como não devo favores políticos a absolutamente ninguém, me permitam ousar dizer o que penso sobre essa hibernação da inteligência militante. Utilizarei o padrão da língua portuguesa e, todos os pronomes, substantivos, adjetivos etc que aparecerem em sua forma masculina também se referem ao feminino.

Para iniciar, é importante deixar claro que, com a idade, background sociocultural, experiência de vida e formação que tenho, não acredito em heróis. Nenhum homem ou mulher que ocupe uma posição política é um herói ou salvador da pátria. No máximo, admiro uma certa posição política num dado contexto. Nem mesmo os autores filosóficos que me influenciaram, por exemplo, são ídolos intelectuais que reverenciaria de forma absoluta. Para mim, todos os “heróis” políticos têm pés de barro.

Isso já é suficiente para me separar desses ativistas que posam como intelligentsia política, afirmando sua religião civil, com seus dogmas políticos sacrossantos, seus rituais revolucionários e suas divindades partidárias (ao mesmo tempo em que, geralmente, condenam as pessoas que professam uma fé religiosa como se essas fossem seres irracionais e ignorantes).

Esses militantes partidários são os que idolatram certos personagens políticos nacionais ou d'alhures, colocando-os sobre altares, onde devem estar intocáveis. Esses ídolos políticos passam, então, por um processo de sacralização ainda em vida, e seus dizeres – independentemente de quão absurdos sejam – passam por um rápido processo de canonização e se tornam dogma da “religião civil” que esses ativistas partidários constroem.

A esta altura, já imagino que tenham dado uma face ao meu comentário (é... se você for um partidário do establishment do dia no Brasil, deve ter se ofendido e imaginado que me refiro a Lula da Silva). Bem, se a carapuça serviu, então que seja! Mas não me refiro apenas a ele, nem apenas ao Brasil. Abraham Lincoln, Getúlio Vargas, John F. Kennedy, Fidel Castro, Che Guevara, Ulysses Guimarães, Fernando Henrique Cardoso, Hugo Chávez, George W. Bush, Barack Obama, Dilma Rousseff, Eduardo Campos, Marina da Silva, Aécio Neves... escolha você mesmo um nome! Todos eles podem estar – e, de facto, estão – sobre o altar de algum devoto partidário.

Bem, se você já se irritou com minha metáfora religiosa, dê-me um desconto. Não consigo subtrair minha formação teológica da linguagem que escolho utilizar para falar daquilo que vejo como uma “religião civil”. Como um teólogo liberal, e como um ministro unitarista, frequentemente critico o dogmatismo cego. Então, você não pode esperar que não criticaria o dogmatismo cego da “religião civil” também.

Voltando ao fanatismo – não, me desculpem, à “hibernação da inteligência” – dos militantes partidários, lembrem-se do que tem ocorrido nos últimos doze anos no Brasil e nos últimos oito anos em Pernambuco.

O Brasil tem sido governado pelo PT desde 2003. O executivo federal tem contado com uma esmagadora aliança no Congresso Nacional, e nos governos e legislaturas estaduais. Os vassalos dos partidos de base dominam as estruturas da máquina pública, dos sindicatos e dos chamados movimentos sociais. Ou seja, o PT e seus aliados reinam quase que absoluta e inquestionavelmente. Mesmo que minha afirmação lhes irrite, isso é um fato.

Agora, pode realmente alguém, em sã consciência, acusar a inútil, ineficiente e patética “oposição” – na verdade, eles nem são dignos dessa alcunha – como os “culpados” pelo que não funciona no país? Que tipo de cegueira estúpida encobre a visão desses militantes partidários?

Só para que se recordem, quem governava o Brasil durante as últimas greves dos diferentes grupos de servidores federais? Eram os “conservadores”, a “direita”, os “fundamentalistas”? Bem, se você também vive no Brasil, terá de concordar comigo e reconhecer que era Dilma Rousseff, com o PT e seus aliados. E se você vive em Pernambuco, terá de reconhecer que nas últimas greves de diferentes grupos de servidores estaduais, era Eduardo Campos (ou seu substituto de última hora), com o PSB (que, na prática, era ele mesmo) e seus aliados.

A crítica, aliás, se estende aos governadores daquilo que por aqui chamam equivocadamente de “direita”, isto é o PSDB, e seus aliados do DEM; assim como de todos os outros partidos nacionais. Se me referi diretamente ao PT e ao PSB, é pelo simples fato de o Governo Federal estar com o PT há três mandatos, e o estadual em Pernambuco estar com o PSB há dois mandatos.

Como os militantes de todos esses grupos podem, honestamente, falar em “mudança”, em “será melhor” etc, quando esses partidos e aliados, e seus candidatos, estão no poder há tanto tempo e, na prática, sem oposição? Quem pode ser tão estúpido a ponto de não perceber que há algo errado na narrativa histórica feita por esses grupos de militantes partidários (de absolutamente todos os partidos)?

Recentemente, li comentários de treze pessoas afirmando que eu estava distorcendo a história quando sarcasticamente postei em minha conta do Twitter: “Em 2013, incendeiam o país protestando contra a corrupção; em 2014, fazem propaganda gratuita p/o Governo protestado... Quem entende isso?

Obviamente, não podia escrever mais que “contra a corrupção” em minha postagem, já que os limites do Twitter não permitiriam mais palavras. Os que se doeram com meu comentário eram militantes da “religião civil” do establishment. Eu, obviamente, havia ofendido a sacralidade de seus ídolos e de seus dogmas. Sua inteligência, aparentemente, fora atingida pelo estado de hibernação do período eleitoral.

Quando, em 2013, o populacho saiu às ruas para “protestar” (e destruir, e queimar, e roubar, e violar direitos, e desobedecer às leis, e desrespeitar a Constituição Federal, etc, etc, etc), contra quem protestavam? Contra alguma entidade imaginária ou contra quem detinha o poder? E quem detinha o poder? Se queriam mais “educação e saúde” e não a “Copa”, contra quem protestavam? Se queriam mais ações governamentais em nome dum “bem-estar social”, contra quem protestavam?... Bem, os militantes que me enviaram mensagens pensam que protestavam contra todos menos os seus respectivos partidos políticos! Não é brilhante isso?!... Para essas pessoas, eu sou ou um ignorante ou um manipulador à serviço “da direita”!... Bravo para eles! Não imaginam o quão envergonhado me sinto por sua letargia cognitiva!

Esses militantes da “religião civil” brasileira são os mesmos que exigem a punição dos envolvidos com a violência da ditadura anuladora das liberdades individuais, como a expressão de opinião, ao mesmo tempo em que exigem a criação de leis que limitariam a liberdade da imprensa que ousa opinar (independentemente do valor de sua opinião) contra as divindades partidárias. Curioso, não?!... Talvez, a melhor classificação para a atitude desses serviçais do Poder seja: HIPOCRISIA. Pura e simples!

O que essa gente não parece compreender é que os governantes e legisladores não nos fazem favores quando realizam obras de qualquer natureza – nas áreas de educação, saúde, segurança, cobertura social etc. Eles simplesmente cumprem a lei – isto é, quando o fazem. Assim, um partido político e um governante não são patriarcas da moralidade; eles são servidores dos cidadãos. Mesmo que, em meu caso, não se tenha votado em quem governa, a partir do momento em que ele ou ela sobe ao poder, estará lá para servir-me enquanto cidadão – e não apenas aos adeptos de sua “religião civil”. Logo, não fazem nada mais além de cumprir com sua obrigação constitucional.

É uma pena que esses militantes – isto é, aqueles que servem entusiasticamente como serviçais gratuitos da máquina eleitoral – não se deem conta das bobagens que gritam por aí, e do papel de tolos que fazem em nome de gente sedenta pelo poder!

+Gibson da Costa