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segunda-feira, 14 de junho de 2010

Verdade e Mito - uma resposta a Defesa316


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Aqui ofereço uma reflexão a respeito de seus comentários na seguinte postagem: http://cristianismoprogressista.blogspot.com/2010/06/compromisso-cristao-brasileiro.html

Os questionamentos que você levanta são válidos e, aqui, são recorrentes. Por essas mesmas questões já haverem sido tratadas aqui muitas vezes, posso garantir que você encontrará minhas perspectivas a respeito desses temas em outras partes deste blog. Prefiro que possamos alargar um pouco mais a discussão.

Não sei a partir de qual base teológica cristã, ou de qual tradição, você molda a janela através da qual enxerga o mundo e interpreta o cristianismo. Seja ela qual for, parece-me que uma das palavras-chave nesta nossa discussão é “verdade”.

O que é verdade? A religião e o conhecimento teológico podem oferecer verdade? E se podem, que tipo de verdade e até que ponto?... Compreender essas questões é essencial para compreender a razão pela qual entendemos o cristianismo de formas tão diferentes – assim como é essencial, também, para compreender a fé de pessoas que abraçam outras religiões. Não posso garantir, entretanto, que alguns não prefiram se esconder numa bolha protetora, não tendo o desejo de pensar a respeito disso, de não encarar questões como essas sem se esconder atrás da muralha do dogmatismo defensivo.

Para que minha posição fique muito clara, é importantíssimo que eu afirme meu ponto de partida: verdade, no que se refere a religião e teologia, não é sinônimo de factualidade. Factual é aquilo que se baseia em fatos que podem ser verificados, ou seja, é algo empiricamente objetivo. A verdade religiosa é majoritariamente subjetiva, ou, quando objetiva, é um tipo de objetividade que requer a presença da subjetividade, já que a grande maioria de suas afirmações não podem ser objetivamente verificadas. Entretanto, apesar de a verdade religiosa não ser factual (=empiricamente objetiva), ela não deixa de ser verdadeira.

Falar sobre verdade religiosa é falar sobre mitos. E antes que você pense que esteja utilizando o termo da mesma forma que usualmente o empregamos (ou seja, para me referir a algo falso, que não mereça ser levado a sério), deixe-me explicá-lo: mitos são narrativas metafóricas a respeito da relação entre este mundo e o sagrado. Por serem metafóricos e por utilizarem uma linguagem não-literal, os mitos não podem ser vistos como se narrassem fatos. Apesar disso, em se tratando de religião, mito e verdade andam de mãos dadas, com o mito sendo a linguagem utilizada para se falar a respeito da verdade. Os mitos são verdadeiros, mesmo que não sejam factualmente (=literalmente) verdadeiros.

Em minha visão, as narrativas bíblicas a respeito de Jesus, por exemplo, são mitos (compreendendo-se “mito” aqui da maneiro como expliquei anteriormente). Como cristão, é indiferente, para mim, a factualidade ou não do que se escreveu a respeito da vida de Jesus. Mesmo que tudo o que se escreveu a seu respeito fosse “mentira” (que não é o mesmo que “mito”), isso não afetaria minha fé, já que minha compreensão da Bíblia não é a de vê-la como um manual de História, mas a de compreendê-la como uma narrativa metafórica (=mitológica) da relação de duas comunidades – os antigos hebreus e os primeiros seguidores de Jesus e dos apóstolos – com seu Deus e com sua tradição religiosa.

Por outro lado, compreender as mesmas narrativas bíblicas a respeito de Jesus como relatos factuais seria um desastre para qualquer cristão pensante contemporâneo, já que muitos daqueles relatos são contraditórios, inverificáveis, claramente falsificados e empiricamente impossíveis – tornando sua “veracidade” (se compreendida como sinônimo de factualidade) simplesmente impossível. Por essa razão, em minha visão cristã liberal, as narrativas bíblicas são relatos verdadeiros, mesmo sabendo que nem sempre são factuais e que sua veracidade não depende de sua factualidade. Leio a Bíblia como uma combinação de história e metáfora, fazendo uso da crítica histórico-textual para compreender os antigos sentidos dos textos bíblicos, colocando-os em seu contexto histórico.

Com isso em mente, você pode exercitar sua capacidade interpretativa e tentar imaginar uma possível resposta minha aos seus questionamentos.

Paz!

+Gibson da Costa

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Compromisso Cristão Brasileiro

“Ó homem, já foi explicado o que é bom e o que o Senhor exige de você: praticar a justiça, amar a misericórdia, caminhar humildemente com o seu Deus.” (Miqueias 6:8)


Nós, cristãos livres brasileiros, declaramos nossa intenção de fortalecer nossos laços e dar uma voz comum ao nosso movimento. Para tanto, assumimos o compromisso de nos guiarmos pelos seguintes princípios:

• Encontramos nos ensinamentos atribuídos a Jesus e nos relatos a respeito de sua vida nossa porta para o caminho que nos leva a Deus, sem, contudo, deixar de reconhecer que outras pessoas podem encontrar seu caminho para Deus por meio de outras portas e que, para elas, seu caminho é tão verdadeiro quanto o nosso é para nós;

• Reconhecemos e afirmamos a dignidade e o valor de TODOS os indivíduos, convidando todas as pessoas a fazerem parte de nossa comunidade sem insistir que se tornem como nós para que sejam aceitas;

• A busca por compreensão através do questionamento é, para nós, mais valiosa e graciosa do que a certeza dogmática e, por esta razão, encontramos nossos laços de união no espírito das Boas Novas de Jesus e não em afirmações ou definições dogmáticas;

• Reconhecemos que a maneira como nos tratamos e a maneira como tratamos outras pessoas e a criação como um todo é a expressão mais plena do que acreditamos;

• Comprometemo-nos a trabalhar pela justiça e paz entre todas as pessoas, protegendo e restaurando a integridade de toda a criação de Deus, e levando eperança àqueles que Jesus chamou de os “menores” de suas irmãs e irmãos;

• Reconhecemos que seguir Jesus exige amor altruísta, resistência consciente ao mal, e renúncia de privilégios.


Este texto foi originalmente redigido e assinado em 1° de julho de 2009, em Recife, PE, por ministros e membros de diferentes grupos cristãos. O movimento que se estruturou a partir de então e com a liderança dos ministros da Congregação Unitarista de Pernambuco passou a se chamar de "Cristãos Livres Brasileiros". Originalmente publicado aqui em http://cristianismoprogressista.blogspot.com/2009/07/compromisso-cristao-brasileiro.html

Princípios Religiosos da Associação Unitarista Brasileira

1. A presença divina se faz conhecer de incontáveis maneiras. O Unitarismo promove uma busca livre e responsável por verdade, sentido, comunhão, e amor.


2. A razão é um dom divino. O Unitarismo abraça a razão e sua progênie, incluindo a aventura científica que investiga o universo.


3. A liberdade é um dom divino. O Unitarismo auxilia no esforço de se encontrar uma forma de exercitar esse dom de maneira responsável, construtiva, e ética.


4. Conscientes da complexidade da criação, dos limites da compreensão humana e da capacidade humana para o mal em nome da religião, declaramos que a liberdade de consciência, o uso da razão, a tolerância religiosa, e a paz devam ser uma parte central de qualquer experiência religiosa.


5. A experiência religiosa é mais satisfatória no contexto de uma tradição. Nossa tradição religiosa é a tradição Unitarista, que enfatiza a importância da razão na religião, a tolerância, a unidade da experiência humana, e a unicidade de Deus.


6. A revelação é contínua. A religião deve buscar inspiração não apenas em sua própria tradição, mas em outras tradições religiosas, na filosofia e nas artes. Apesar de dar o devido valor às lições aprendidas no passado e à importância da tradição religiosa, a religião não deve ficar estagnada, mas deve empregar a razão e a experiência religiosa para evoluir de uma maneira construtiva, iluminada e satisfatória.


7. Conscientes das necessidades espirituais e materiais de outros homens e mulheres, do mal ao qual possam estar sujeitos e das tragédias que possam estar sofrendo, obras de misericórdia e compaixão devem ser parte de qualquer experiência religiosa.


8. O Unitarismo afirma o valor e a dignidade inerentes a todos os seres humanos. Por isso, esforçamo-nos para que usemos de eqüidade, justiça, e compaixão em nossas relações, mantendo nossas mentes, mãos e corações abertos para receber a todos.


9. Nossa crença no valor e na dignidade inerentes de todos os seres humanos leva-nos a entender a violência, as guerras, a exploração, o racismo, o machismo, a xenofobia, e a homofobia, em todas as suas formas, como incompatíveis com nossa tradição unitarista.


10. A vida da humanidade está entrelaçada com a vida deste planeta, da mesma forma que está seu futuro. Por essa razão, o Unitarismo afirma nossa responsabilidade em cuidar do bem-estar de nosso meio-ambiente natural, e zelar para que os recursos naturais presentes neste planeta, assim como a vida de outros animais e vegetais, possam perdurar em segurança enquanto existirmos.



(Associação Unitarista Brasileira)

A Aliança de Ames



"Na liberdade da verdade, e no espírito de Jesus Cristo, unimo-nos para adorar a Deus e servir a humanidade."



- “A Aliança de Ames”, escrita por Charles Gordon Ames para a Sociedade Unitarista de Spring Garden na Filadélfia, em 1880, e posteriormente adotada por muitas igrejas unitaristas.

A Aliança Unitarista (1870)

Cremos:

Na Paternidade de Deus;

Na Irmandade do Homem;

Na Liderança de Jesus;

Na Salvação pelo Caráter;

No Progresso da Humanidade.


(Essa foi uma declaração de fé unitarista muito comum de 1870 até meados do século XX em muitas igrejas unitaristas dos EUA, e foi adotada pela Congregação Unitarista de Pernambuco em 1933.)

Uma Declaração de Fé Unitarista

Encontrando um lar no deserto de Deus,

buscamos saborear Deus

e magnificar os desejos de Jesus.

Ousamos duvidar.

Praticando a compaixão e despertando a consciência,

levamos esperança a um mundo que sofre.

Neste Espírito, honramos uns aos outros

em uma comunidade de amor.


(Congregação Unitarista de Pernambuco)

Uma Aliança Congregacional Unitarista

Por sermos abertos à diversidade teológica – ou seja, por admitirmos diferentes compreensões teológicas em nosso meio -, as comunidades unitaristas costumam se centrar não em torno de um “credo” ou de uma “confissão de fé”, mas em torno de alianças ou convênios.


A Congregação Unitarista de Pernambuco possui uma “aliança” congregacional que é requerida como uma espécie de promessa feita entre seus membros para o convívio em nossa comunidade de fé. O seguinte é o texto dessa aliança, e é declarado por todos aqueles que se tornam membros de nossa comunidade, além de ser frequentemente recitado em nossas liturgias congregacionais:


O amor é a doutrina desta igreja,

E o serviço é a sua oração.

Habitar juntos em justiça e paz,

Buscar a verdade com liberdade,

Respeitar o valor e dignidade de todas as pessoas,

E servir a humanidade juntos,

A fim de que todas as almas

Possam crescer em harmonia com o divino,

Esta é a aliança que fazemos uns com os outros.”


(Aliança de Williams, escrito originalmente pelo Rev. J. Griswold Williams em 1933, e adaptada pela Congregação Unitarista de Pernambuco.)

Conhecendo o Cristianismo Unitarista

Então você se interessou pelo Cristianismo Unitarista, mas ainda não sabe muito bem o que é isso? O objetivo deste texto é dar-lhe uma introdução breve de quem somos e de como escolhemos viver nosso 'cristianismo'. A intenção aqui não é descrever de forma decisiva as crenças dos cristãos unitaristas, já que cristãos unitaristas não aderem a crenças dogmáticas imutáveis. Eu espero apenas, poder dar uma visão geral do que a maioria de nós entende ser nossa tradição religiosa.

A Congregação Unitarista de Pernambuco é uma pequena congregação pluralista de cristãos liberais ou que derivam sua inspiração de uma visão alternativa de Cristianismo. Convidamos cristãos teológica e culturalmente liberais ou progressistas – assim como todas as outras pessoas - a se juntarem à nossa comunidade.


Cristianismo Alternativo

Muitas pessoas não sabem que o fundamentalismo, o pentecostalismo, o evangelicalismo, e mesmo o catolicismo não sejam as únicas manifestações de Cristianismo em nosso mundo. Há perspectivas cristãs alternativas que não carregam a bagagem do exclusivismo, preconceito, e dogma rígido que muitas pessoas associam com a religião cristã.


Os Fundamentos do Unitarismo

Na verdade, uma das formas mais permanentes de “Cristianismo alternativo” é o Cristianismo Unitarista. As igrejas unitaristas se fundamentaram nos ideais éticos e espirituais do Cristianismo Protestante, com raízes teológicas no Cristianismo mais antigo do primeiro milênio. A palavra “unitarista” originalmente significava a crença de que Deus seja uma “Unidade” singular, diferentemente da noção da “Trindade” - ou Deus como sendo três pessoas - que não foi desenvolvido pela igreja cristã até o quarto século. Assim, o Unitarismo se desenvolveu como um movimento não-conformista dentro do Cristianismo, discordando das doutrinas e dogmas da igreja estabelecida, e apelando à liberdade individual e à razão, com uma ênfase na vida e ensinamentos de Jesus, em vez de especular a respeito de sua natureza cósmica.


Uma História de 400 Anos

O mesmo era verdade quando o sacerdote húngaro, Dávid Ferenc fundou a Igreja Unitarista no Reino da Transilvânia em 1568 durante a Reforma Protestante. Um breve período de tolerância religiosa proclamada pelo Rei João Sigismundo permitiu este evento. Apesar de este período ter sido seguido por repressão religiosa, durante a qual o Bispo Dávid foi aprisionado (seguida por sua morte na prisão em 1579), este iniciou a história de 400 anos do movimento unitarista. A Igreja Unitarista continua como o lar religioso de muitos cristãos húngaros hoje (a maioria na Romênia). Estas igrejas cristãs unitaristas na Romênia e na Hungria são duas das maiores denominações unitaristas no mundo hoje, as outras sendo a Associação Unitarista Universalista de Congregações nos EUA, o Conselho Unitarista Canadense, a Assembléia Geral de Igrejas Unitaristas e Cristãs Livres da Grã-Bretanha, e a Conferência Unitarista Americana.

Na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, o Cristianismo do século XVIII dos Unitaristas foi muito influenciado pelo Iluminismo, resultando numa fé na qual a razão e a experiência eram vistas como iguais (e eventualmente maiores) medidas de crença juntamente com as Escrituras e a tradição. Esse Cristianismo liberal tem mudado e evoluído nos últimos duzentos anos, na expressão de vários teólogos e ministros unitaristas (principalmente americanos), incluindo, Joseph Priestley, John Murray, William Ellery Channing, Hosea Ballou, Ralph Waldo Emerson, Theodore Parker, James Freeman Clarke, James Luther Adams, e Charles Hartshorne.


O que mais nos distingue de outros grupos cristãos, entretanto, não é uma lista de doutrinas teológicas, mas nosso princípio de liberdade - liberdade de acessarmos as Escrituras e outros elementos de nossa tradição e as interpretarmos de acordo com nossas próprias consciências individuais; liberdade para nos relacionarmos com Deus e com o mundo ao nosso redor sem que sejamos limitados por imposições dogmáticas e eclesiásticas; liberdade para discordarmos respeitosa e livremente de outros membros de nossa comunidade e de nossos ministros, sem que sejamos punidos por isso; liberdade para desenvolvermos nossa própria compreensão de nosso lugar neste mundo, sem que sejamos excluídos por não nos encaixarmos em uma visão pré-determinada. O que nos une, é nosso desejo de sermos uma família regulada por princípios e não interpretações petrificadas da "verdade". Se você sente que poderia nos ajudar a construir e alargar tal comunidade, junte-se a nós!


Rev. Gibson da Costa – ministro da Congregação Unitarista de Pernambuco
(Adaptado de um folheto da Congregação Unitarista de Pernambuco)